sexta-feira, 6 de fevereiro de 2015

A garota da minha vida - Capítulo 13


Capítulo 13

EMILY


Autoras: Hadassa Fentanes e Júlia Barbosa


Era difícil saber quanto tempo havia se passado.



Nós começamos a tocar, e de repente, parecia que aquilo era a única coisa que existia. A gente. A música. As pessoas gritando e aplaudindo ao nosso redor. Eu nunca havia experimentado uma sensação tão boa quanto aquela.

E eu não achava que poderia melhorar, e foi quando o Samuel anunciou que a minha música iria tocar. A música que eu mesma havia composto. A música que fez dezenas de pessoas aplaudirem logo em seguida. Eu não sabia como deveria me sentir. Parecia que havia tanta felicidade dentro de mim que eu iria explodir a qualquer momento. Eu nunca tinha sorrido daquela maneira. Chegava a gargalhar de alegria.

E foi então que eu avistei.

Lucas e Clarice estavam lado a lado ali na frente do palco. Eles pareciam felizes também, estando juntos, e foi aí que eu não aguentei mais.

Não sei o que é que deu em mim. Parecia que eu não controlava os meus próprios pés. E estes caminhavam direto na direção do Lucas.

Desci do palco e andei em meio à multidão de pessoas. Quando finalmente parei na frente dele, ouvi Clarice dizer alguma coisa, mas as palavras se perderam em meio ao barulho altíssimo que eu escutava, que só depois fui me ligar que era o meu coração batendo.

Eu estava beijando o Lucas.

Não sei como descrever a sensação. Borboletas no estômago? Fogos de artifício? Tudo isso parece brega demais pra mim. Mas devo dizer que com certeza foi bom. Foi bom e eu não consegui pensar em mais nada a não ser no quanto foi bom durante algum tempo. Foi bom até que de repente me toquei no que eu estava fazendo.

Caramba.

O que é que eu tinha feito?!

Larguei o Lucas, que me encarava de olhos arregalados. Eu não podia esperar reação diferente. Na verdade, a minha expressão devia estar exatamente como a dele naquele momento. Ao meu redor, Clarice havia sumido e as pessoas aplaudiam e davam gritos de incentivo.

E foi quando eu reparei que uma delas se aproximava enquanto aplaudia. No início, foi difícil ver quem era, mas então, quando ela finalmente parou ao meu lado foi que eu a reconheci.

Era o Tuca.

Eu já estava chocada demais com tudo aquilo e não fazia ideia do que deveria fazer na hora.

– Meus parabéns! E que música linda! É realmente isso que eu estava procurando. – disse ele, apertando minha mão e me tirando do transe momentâneo – E aquele beijo, meu Deus. Foi você quem pensou naquilo?

– Eu...

– Tenho certeza que foi! Uma ideia genial, com toda a certeza.

O Tuca era um sujeito realmente bizarro. O jeito sempre alegre e os olhos saltados davam a impressão de que ele era realmente louco. "A Lana vai gostar dele", foi a única coisa em que consegui pensar.

Rapidamente, ele me levou até perto do palco e fez sinal para que o resto da banda descesse. Ben foi o primeiro a descer, seguido por uma Lana que saltitava de felicidade e um Samuel totalmente perplexo.

– Entrem, entrem – falou Tuca animadamente, enquanto abria a porta de um pequeno escritório no fundo do bar.

– Ei, e as pessoinhas? – Lana perguntou, apontando para a plateia que observava a estranha situação.

– Oh, quase me esqueço – e então virou-se na direção do balcão e gritou: – Bebidas para todos, por minha conta!

Enquanto todos comemoravam, Lana cochichou alguma coisa no ouvido do produtor, que a ouvia atentamente.

– E todo o refrigerante de laranja que tiver para essa senhorita aqui! – acrescentou, piscando para ela.

Lana saiu correndo em direção ao balcão enquanto o resto da banda foi para a tal salinha, onde resolvemos sobre o contrato e tiramos nossas dúvidas.

Aparentemente, o organizador do evento era um grande amigo do Tuca e avisou a ele da mudança de data. Ele só não respondeu aos inúmeros telefonemas do Ben porque estava extremamente ocupado em um tour internacional, o que fazia bastante sentido.

Quando saímos da sala, vibrando de felicidade, nos deparamos com música alta, pessoas dançando e um Lucas que, pelo jeito, não conseguia se enturmar com ninguém.

Foi então que toda a vergonha de minutos antes veio à tona, e tudo o que eu queria era sumir dali o mais rápido possível. Evitei todas as pessoas que tentavam me parabenizar pelo caminho e disse um "até mais" em resposta à Lana que acenava coberta de algo parecido com refrigerante. Esperava que ninguém tivesse notado minha fuga repentina, principalmente o Lucas.

As semanas seguintes passaram voando. Eu e a banda fomos até o prédio onde o Tuca trabalhava no centro da cidade e foi uma loucura. Tudo era tão surreal: aquele prédio luxuoso, a sala de ensaio bem decorada, os instrumentos novinhos em folha. Depois de contrato assinado, estava na hora de começar a tocar, e a primeira música com certeza era a minha.

Tudo estava acontecendo tão rápido que eu quase esqueci o incidente com o Lucas no nosso primeiro show. Quase.

Ninguém fez nenhuma tentativa de comentar comigo sobre o ocorrido e qualquer conversa suspeita, eu rapidamente reprimia, principalmente quando vinha da Lana. Ela parecia a mais decidida a descobrir o que houve, e às vezes, até o Samuel me ajudava com isso, interrompendo o que quer que ela fosse falar, e depois olhava para mim com um sorrisinho. Muito, muito estranho. Definitivamente, não gostei disso.

Mas, bem, como não podíamos ser uma banda de uma música só, e todos haviam adorado a minha última, eu acabei tendo que compor mais uma. Às vezes, eu me sentava na varanda de casa, aproveitando a brisa morna do verão, e tentando pensar. E foi justamente num desses dias, que uma voz familiar veio do outro lado do muro:

- Oi, Lucas – disse aquela voz meiga e irritante. Sim, você já adivinhou. Clarice. Aquela garota parecia adivinhar toda vez que eu precisava de paz e sossego pra escrever e vinha perturbar a minha vida. Ou melhor, vinha perturbar o Lucas, o que acabava me incomodando também.

- Oi - eu ouvi ele dizer. Aparentemente, estava na varanda da casa dele também - Achei que não quisesse mais me ver.

Ela riu. Aquela risada me irritava.

- Eu também achei isso por um tempo - ela respondeu - Eu posso entrar?

- Claro - o Lucas disse, e eu ouvi o barulho do portão abrindo e fechando.

Mas que droga. Aquela garota me odiava, só podia.

Peguei a cadeira da varanda que ainda estava inteira para encostar no muro, mas então pensei melhor e peguei uma escada.

Subi até os degraus mais altos e espiei por cima do muro.

- Eu vim conversar com você - Clarice disse, se aproximando dele - Sobre o que aconteceu.

-É, a gente precisa mesmo - Lucas comentou.

Ah, não. Por favor, de novo, não.

- Eu não quero enrolar muito, então vou direto ao ponto - ela falou - Eu passei semanas pensando sobre isso e cheguei a uma conclusão.

Lucas engoliu em seco. Parecia que tinha prendido a respiração.

- A verdade - Clarice continuou - é que eu gosto de você, Lucas. De verdade. Mas acontece que eu também gosto do Samuel. Não da mesma maneira, é claro. E eu acho que não seria justo com nenhum dos dois, nem comigo mesma, se isso continuasse desse jeito.

Lucas soltou a respiração. Parecia surpreso, mas aliviado, de certa forma. Eu também soltei a respiração, sem nem saber que a havia prendido.

- Que bom que você também se sente assim - ele disse - Eu tinha medo de que não concordasse.

- Eu só estou muito confusa no momento, e acho que prefiro não ser a namorada de ninguém agora, pelo menos por enquanto. Você não vai ficar chateado, vai?

- Não - Lucas balançou a cabeça, sorrindo - Não, de forma alguma. Eu fico feliz que as coisas não tenham terminado mal entre a gente.

- Eu também - ela disse - Eu estou indo pra casa do Samuel, falar com ele agora. Soube que vocês se entenderam.

- É, nos entendemos, sim. Às vezes, a gente ainda perde a cabeça um com o outro, sabe? Mas até agora ninguém se machucou grave, então eu diria que estamos bem.

Clarice riu novamente, e dessa vez, a risada dela não parecia tão irritante assim.

- Tudo fica bem quando acaba bem – Disse, por fim. Então, com um sorriso, ela se inclinou e beijou a bochecha do Lucas - Tchau, Lucas. A gente se vê por aí.

- A gente se vê - ele falou, também sorrindo.

Clarice foi até o portão e o abriu. Quando estava quase do lado de fora, de repente ela se virou e olhou para ele com um sorriso travesso.

- Então... - ela disse - Você e a Emily...

Lucas corou. E eu também.

- Bem, isso é um assunto pra depois - ele retrucou.

Então Clarice fechou o portão e foi embora. Lucas entrou em casa logo em seguida. E quanto a mim? Bem, desci a escada com um sorriso inexplicável no rosto, e uma inspiração notável para uma nova música. Esperava que ficasse boa.

À noite, quando entrei no facebook, vi uma mensagem do Ben:

"Squalor, no sábado às 15h00 \o/
Não esquece!"

É, parecia que os outros haviam percebido minhas tentativas de fugir do Lucas. Se não, teriam escolhido qualquer outro dia e não um dos dias de folga dele pra marcar a reunião.

Depois de um tempo no computador, eu acabei apagando e acordei com uma dor horrível no pescoço. Definitivamente, cadeiras não são bons lugares para se dormir.

Tomei um banho, preparei meu café da manhã e decidi ir assistir TV. Depois de um tempo, começou um daqueles programas de auditório que eu não suporto e decidi andar pela casa.

Andei até o quarto dos meus pais, onde a porta estava entreaberta, e vi ambos dormindo tranquilamente. Além de vários papéis que a minha mãe trazia do serviço espalhados pela escrivaninha.

Naquele momento, eu prendi o meu cabelo, e decidi que ajudaria em casa como pudesse. Fui até a cozinha e decidi que aquela louça deveria ser limpa.

Passei o resto do dia fazendo trabalhos da faculdade e, quando eram dez pras três eu saí de casa. Chegando no Squalor, vi que o pessoal já tinha chegado e logo puxei uma cadeira pra junto da mesa. Mal podia esperar pra ver o que eles achariam da nova letra.

Entreguei o papel ao Samuel e pude perceber que enquanto ele lia, ia abrindo um sorriso cada vez maior.

– Cara, isso ficou... Tá ótimo! Ainda melhor que o primeiro.

Eu agradeci e fiquei realmente feliz, era bom ser reconhecida às vezes. Lana e Ben leram e tiveram reações bem parecidas, tirando o fato de que a Lana resolveu me comprar jujubas porque "meu Deus, que lindo, você merece jujuba!". É, ela nunca foi muito normal.

O Samuel começou a explicar sobre como seria a nossa programação de shows quando, de repente, todos pararam pra ver quem tinha entrado na lanchonete. Era a Clarice.

Assim que a vi, eu pensei que ela deveria ser doida de pedra por ter aparecido, e olhei para o Samuel, me preparando para o pior.

– Ei, vem sentar com a gente.

Primeiro, eu fiquei realmente surpresa. Não esperava que o Samuel fosse reagir dessa forma. Mas depois percebi que ela provavelmente já tinha resolvido tudo com ele também.

A reunião passou voando e logo eu já estava indo pra casa. E, para completar as bizarrices do dia, o Lucas estava parado na frente da minha casa.

– Emily, eu...

Passei por ele e fechei o portão. Não queria conversar com ele, principalmente sobre aquilo. "Por que ele não esquece logo?", era o que eu pensava.

E então eu ouço barulhos estranhos vindo do outro lado do muro. Resolvo ficar observando e, depois de um tempo, percebo que não era nada mais nada menos do que o Lucas me observando por cima do muro.

- Oi – ele disse, como se fosse a coisa mais normal do mundo.

– Você ficou maluco? Não se pode ficar bisbilhotando os outros assim. Saia já daí!

– Ah, você mesma já fez isso milhares de vezes.

– Eu nunca faria isso, desce agor...

– Então como você quebrou a perna? – ele perguntou, sorrindo.

Ele sabia. E agora? Eu não fazia ideia do que fazer. Queria desesperadamente sumir e nunca mais precisar encarar ele de novo na minha vida.

– Eu sabia – e dessa vez o sorriso era ainda maior.

– Era isso o que você tinha pra dizer? Bem, porque se for pra rir da minha cara, eu já vou...

– Não, é outra coisa.

– Como assim?

– Primeiro, eu quero te pedir desculpas por não ter entendido antes. Na época, eu estava totalmente ocupado com a Clarice, pensava que ela era realmente a garota da minha vida. Não conseguia perceber o que estava acontecendo com você.

– Olha, eu é quem peço desculpas, eu não devia ter feito aquilo. Você não precisa ficar com medo de me magoar ou coisa assim. Eu entendo seu lado, não precisa se desculpar. E o que mais você ia falar?

– É... Eu queria saber se você vai estar livre na terça.

– Eu? Na terça? Com você? – eu com certeza não estava esperando por isso.

– Isso – acenou com a cabeça, enquanto ficava cada vez mais vermelho.

– E-eu, preciso pensar.

– Olha, não é um encontro, é só... Eu gostaria de ir ao cinema com você, se não quiser ou puder, eu...

– Sim.

– Hein, sim?

– Sim, eu estou livre na terça. Eu aceito ir ao cinema com você.

– Oh! – ele pareceu demorar a entender minha resposta. – Então, terça, eu passo aqui, às sete.

– Às sete.

– Até – ele se despediu e rapidamente sumiu atrás do muro.

Essa conversa curta e estranha, por cima do muro, foi a coisa mais estranha e maravilhosa que me aconteceu. Depois disso parecia que as coisas foram ficando cada vez melhores.

A banda foi fazendo cada vez mais sucesso, chegando a gravar o nosso primeiro disco, o que fez com que o Samuel se tornasse a pessoal mais feliz do mundo inteiro, além da Ana, mãe da Lana e do Ben, que agora tinha orgulho de dizer para as amigas que o filho tinha arranjado um emprego de verdade.

A Clarice passou a se dedicar mais a cursos e aos estudos, e pelo visto não pretende namorar por um bom tempo. Quanto à Lana, ela está duplamente feliz, porque Michelângelo agora é pai de uma ninhada de gatinhos e porque agora ela tem o próprio dinheiro para gastar com refrigerante de laranja.

Quanto a mim?

Bem, eu vou vivendo cada dia de uma vez e parece que eu e o Lucas estamos nos falando mais de lá pra cá. Se isso vai dar em alguma coisa? Bem, é cedo pra afirmar. Seria ele o garoto da minha vida?

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